Num ímpeto apressado, levantou-se da cama e colocou sobre si um vestidinho bicromático e floral, com abotoaduras de laços (que lhe deixava os ombros sardentos à mostra em noite de chuva).
Passou um blush rosado, um protetor nos lábios já rachados (e nem estava na época da secura lancinante), calçou uma sapatilha preta e voou para fora.
Bateu a porta do carro e encarou o painel:
-Ah, droga, tenho que por gasolina.
Foi direcionada ao posto.
Lá chegando, cumpriu o ritual rotineiro de tirar a chave e dizer:
-Completar de comum, por favor.
Até que...
-Mociiiinho, pára! Esqueci a carteira em casa, vou buscar e já volto!
O frentista riu- compreensivo-, com aquele sorriso indicativo de que a 'avoação' da moça tudo tinha a ver com a cor de seu cabelo.
Depois de tudo pronto, finalmente foi em direção a mega bookstore, esperançosa e cheia de certezas de que lá encontraria os livros para sua pesquisa científica.
Não encontrou. Mas, ainda assim, manteve o velho hábito de sempre: Comprar ao menos um livro a cada vez que entrasse na loja.
Marcela não entendia como alguém conseguia sair sem nada nas mãos de um estabelecimento daquele tamanho: Eram tantos livros, tantas histórias, tantas opções a serem exploradas, tantas capas, tantas cores...
Aborrecida com a quantidade de pessoas no shopping, decidiu que ia até a loja de departamentos comprar lápis, cubas de gelo, bloquinhos (eram seu vício!), copos, canetinhas (não se controlava jamais!) e mais itens totalmente desnecessários a sua casa já completa.
Depois de tudo na cestinha, olhou para fila e desistiu da mínima chance de perder minutos de sua vida por ali. Abandou as futuras compras e foi-se embora.
Mais uma vez no carro, ligou o som e sentiu uma profunda vontade de encontrar os amigos. Um desejo que constrastava com a responsabilidade e a obrigação de voltar para casa e estudar.
Depois da dualidade entre bom senso e massiva vontade, saiu a telefonar e marcar programas. Marcela furou em todos eles. (Talvez pela culpa de ter consagrado o desejo como vitorioso).
Saiu dirigindo e pensando que quando olhava pra dentro de si mesma por vezes via tanta solidão (acaso fumasse, essa seria a hora de acender um cigarro tirado sem muitos cuidados da bolsa). Mas sempre censurava esse pensamento por julgá-lo injusto com todos aqueles que a cercam...
Atravessou a cidade plana e fria sem perceber, e já bem distante de qualquer lugar que pudesse sentar e sentir-se em Paris, começou a atinar para a secura que estava em sua boca: tinha sede.
Só que, por ser Marcela, sua sede era complicada de saciar: ela queria uma soda siciliana de amora.
-Oh, droga! O único lugar que vende soda siciliana nessa cidade fantasma e querida é do outro lado do ponto onde estou agora...
Mas ela era incontrolável em seus desejos e ia até lá mesmo assim.
E ia sozinha. Sentia falta de si mesma. Carregava consigo suas novas aquisições em livros e pensou que seria divertido sentar no Café e tomar uma soda siciliana de amora...
Imaginou que lá estaria quente e aconchegante e que poderia ver Paris diante de seus olhos.
Deu meia volta e, sem muita culpa, pensou:
-Ah, acabei de colocar combustível mesmo...
Cantava Djavan e ansiava por sentar-se isolada com seus novos livros e sua soda de amora.
Chegando no Café, percebeu o quão estava cheio. E assim ela não queria. Assim haviam ruídos de outras pessoas. Assim havia demora. Assim não haveria Paris e nem silêncio e nem sua necessária solidão.
Sequer estacionou o carro e, decepcionada, foi embora.
Novamente cidade plana. Novamente escura. Novamente frio. Novamente chuva.
Tomou juízo que talvez esse sentimento em si daria um conto pro blog e foi para casa.
Não acendeu as luzes, sentou-se no computador e pensou que a Coca-Cola (que ela nem gostava!) poderia substituir a soda siciliana.
Enganou-se!
Mas, como nada nesse mundo fica impune e a solidão às vezes não cai bem a uma mulher que tem o mundo na cabeça, recebeu um telefonema:
-Marcela, estamos indo pra chopperia. Vamos?
E ela, mesmo sendo abstêmia, consentiu.
8 comentários:
Adoro sua escrita, garota!
Soda siciliana de amora pra ti, e maçã verde pra mim... :)
Podemos dividir uma de melancia depois? *.*
tá no teu sangue escrever pô!!
geralmente eu não tenho muita paciência pra ler no pc, mas é engraçado como toda vez que leio o que vc escreve parece que foi só uma pequena frase!!
Dani, um sorriso bem grande de mim pra você!
nao sei porque, mas me identifiquei bastante com a marcela!!
"-Mociiiinho, pára! Esqueci a carteira em casa, vou buscar e já volto!"
a compra de itens desnecessarios pra casa,soh que eu nao desistiria da compra.. ir na livraria e querer comprar alguma coisa, e ateh a vontade de ficar sozinhaa!
a diferenca eh que no carro eu teria fumado um cigarro rss
Enfim AMEIIIII o texto.. me super identifiquei!
bjoooooo
Dans Paris - crônica de uma auto-voyer auto-mobilizada!
Hahahaha, adorei, Deb! Mas eu não me chamo Marcela...
toujour, toujour...la place que les livres apporte est le grand monde de nos desir.
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